Ponto de Vista

Terrorismo e violência urbana
Por Patrícia Nuno - Delegada de Polícia Civil Da Bahia
Na onda do terror, ouço falar que soa toque de recolher ora aqui, ora acolá. A Polícia contradiz aquilo que é reverberado pela imprensa local e, com a velocidade da luz, pela rede social.

Se não fosse pela ordem cronológica dos acontecimentos, diria que os ataques ocorridos em Paris na última sexta-feira 13 foram o marco de virilização dessa onda de terror, mas as ações baianas tiveram início há mais de uma semana e culminaram com a morte de uma jovem policial num posto de saúde em Pituaçu.  Que dor, meu Deus!! Mais um tiro na nossa cabeça que se recusa a aceitar a própria vulnerabilidade.

Nesse momento de consternação geral e guerra declarada é preciso identificar as diferenças entre essas duas manifestações de violência grotesca: o terrorismo e a violência urbana.
Uma ação terrorista é o ápice de um longo processo que envolve planejamento, determinação de objetivos, captação de recursos financeiros, cooptação e preparação de agentes, bem como a declaração de autoria que se dá, logo em seguida, na oportunidade de uma  mídia gratuita.

Quanto mais calorosa a sensação, maior o poder de barganha. O terrorista busca um respaldo político, cultural, econômico ou religioso. Os grupos mais conhecidos hoje: Al-Qaeda , Estado Islâmico, Boko-Haram, Hamas, Farc, Ira, e ETA.

Por outro lado, temos a violência urbana, tema abrangente e pouco elucidativo. Abro parênteses para uma observação em relação aos índices de violência na Bahia que, conforme relatório Diagnóstico dos Homicídios no Brasil, divulgado este ano pelo Ministério da Justiça , apresenta, em números absolutos, 5.450 casos (36 por 100 mil habitantes), seguida pelo Rio de Janeiro (4.610) e São Paulo (4.294), com taxas de 28 e 9,8 por grupos de 100 mil habitantes, índices de 2014.

O secretário-geral do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Lima, responsável pela
publicação do Anuário, manifesta-se sobre a falta de uma metodologia nacional, na
revista Carta Capital de 2011, com o título Os Números nunca Mentem? A falta de um
padrão nacional abala a confiança nas estatísticas criminais, dizendo que "isso torna inviável a comparação de dados estatísticos entre os estados”. Reforçando este argumento, a secretária nacional de Segurança Pública, Regina Miki, reconhece a precariedade dos dados: "Nosso sistema depende das informações dos estados, que usam critérios diferentes, normalmente aqueles que mais interessam aos respectivos governos”.

Urge, portanto, a estruturação e sistematização de uma metodologia nacional, a fim de dirimir as possíveis discrepâncias. Reconheço os esforços empreendidos pelas nossas polícias no trabalho de reduzir os índices de crimes contra a vida. Confio nos comandantes atuais porque conheço e sei do seu compromisso com a missão e da sua capacidade para realizar um grande trabalho.

Fecho parênteses e parto para as entranhas sociais, onde as feridas sangrentas estão instaladas há muito tempo, com perspectivas mínimas de estancamento, enquanto não houver ampla reflexão, conscientização e atitude de cada um de nós. A violência urbana é expurgo da nossa falta de urbanidade, falta de cultura, educação, amor ao próximo, passando pelos nossos lares, pela corrupção, pela ganância e pelo racismo. A violência urbana é retorno do que absorvemos, portanto, é reação, fruto dos nossos conceitos e preconceitos, discriminação e fruto do que gostamos e apoiamos, do que achamos normal enquanto alheio, do nosso modo de conduzir a vida, do modo de pensar.

Pois é, somos píxels da obra urbis, que expõe com toda fidelidade o nosso quadro de saúde mental. Enquanto não houver um clarão de consciência que nos faça alcançar o verdadeiro sentido de paz enquanto indivíduos e sujeitos, ficaremos empacados produzindo o mal. Segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos. A cada um de nós, muita paz, saúde e responsabilidade.